RECIFE

Largo da Santa Cruz volta a brilhar

Novos empreendimentos de lazer e cultura somam-se aos tradicionais, trazendo vida ao Centro

Karol Pacheco
Cadastrado por
Karol Pacheco
Publicado em 24/05/2015 às 5:43
Foto: André Nery/JC Imagem
FOTO: Foto: André Nery/JC Imagem
Leitura:

São muitos os orgulhos despertados pelo bairro da Boa Vista na boemia artística e intelectual, etílica e ativista do Recife. Os redutos que acolhem seus praticantes estão tão interligados que, às vezes, alguém está tomando um chopinho em um lugar e já lembra do outro. Caso do cliente que, sendo atendido por um dos bares da Rua Mamede Simões, ao lado da Assembleia Legislativa, não contendo o entusiasmo, celebrou: “Eita, são as torradinhas da Padaria Santa Cruz”, exclamou, ao receber seu caldinho de feijão e ver, ao lado, pousados no prato, os pequenos círculos de pão torrado besuntados generosamente com manteiga bem amarelinha. 

A tradicional panificadora em questão está situada no Largo da Santa Cruz, por muitos chamado de pátio, à frente da igreja de mesmo nome. Aquela vizinhança, que já foi cenário do filme Lisbela e o prisioneiro, agora, é a localização “mais quente”, da Boa Vista, para quem procura diversão. Ao tradicional Mercado da Boa Vista, que há muito é apoteose por ali, alguns novos empreendimentos vieram se juntar e estão fazendo sucesso. 

 

O Largo da Santa Cruz, logradouro em frente à igreja de mesmo nome, tem se tornado, sobretudo nos últimos seis meses, ponto de migração dos notívagos e também dos que preferem uma farrinha diurna nos fins de semana. Prova disso, são os bares e espaços culturais novos como o Lisbela & Prisioneiros, Edifício Texas, Lesbian Bar e Espaço Casarão (este último inaugurado ontem), que têm movimentado o entorno do Pátio com atividades culturais quase todos os dias da semana.

Quando Juniani Marzani, o DJ 440, propôs a Marcos Antônio da Silva tocar vinis no Lisbela & Prisioneiros, todas as terças-feiras, o gerente do bar inaugurado no ano passado ficou receoso. “Esse negócio de DJ...”, lembra 440. Hoje, percebe-se no local a convivência de um público heterogêneo: “Coroa, jovens, galera de trinta, todo tipo de público. Tem dia que dá até criança”, conta Juniani sobre a iniciativa que atraiu novos públicos ao local.

Aqui, no Pátio, cada um tem um público, mas todos confraternizam. Aqui é onde tudo se mistura. Tem muita gente cansada da homogeneidade


Poucos meses depois, na ressaca carnavalesca, os irmãos Pedro e Tiago Escobar abriram o Edifício Texas. “Percebi que aqui é um lugar que, se jogar um pouquinho de água, vai brotar de todo lado. As pessoas têm vontade de frequentar o Centro. E, apesar de ser Centro, é como numa cidade do interior, pois as pessoas nas ruas são as mesmas”, justifica Pedro, lembrando do sucesso da after party que sucedeu a última exibição do filme Tatuagem, num arrastão que trouxe espectadores do Cinema São Luiz até o edifício. “O Texas começou e está meio que na moda, mas mais do que na moda é contexto. A nossa ideia é estabelecê-lo como um espaço cultural. Aqui, no Pátio, cada um tem um público, mas todos confraternizam. Aqui é onde tudo se mistura. Tem muita gente cansada da homogeneidade”, arremata Tiago.

Depois de três anos sendo realizado numa casa com quintal, no Poço da Panela, mês passado, foi o Lesbian Bar que se aprochegou. “Acho que o principal agora é ser menos protagonista. Estar num lugar onde já acontecem várias outras coisas – o mercado, a padaria e essas casas novas, o Lisbela, o Texas, gente na rua”, conta o idealizador Fernando Peres. Esse Lesbian Bar “é mais íntimo, cabem no máximo umas 237 pessoas, a casa é linda, cheia de cantos/recantos”, brinca. “Como na outra encarnação, o Lesbian não é um bar, é uma casa onde acontece o bar e outras atividades.”

Clique no mapa para conhecer um pouquinho mais:

 



MUITA HISTÓRIA

Até 2014, um posto de gasolina abandonado era a ferida cravada no meio do Largo da Santa Cruz. Os moradores e transeuntes tinham medo que os tanques subterrâneos explodissem e esse sentimento respingava na área, que penou com o descaso. “Dos anos 1990 pra cá, esse lugar foi perdendo o brilho. Ainda se salvava o Mercado da Boa Vista, que trazia gente nos finais de semana, mas à noite ficava um breu. Essa movimentação é do final do ano passado pra cá”, reflete o aposentado Paulo Henrique Pereira, 66 anos, depois de pagar no caixa da cinquentenária Padaria Santa Cruz o seu pão-de-ló e torradinhas amanteigadas.

Foto: André Nery/JC Imagem
Fachada do atelier de Rinaldo na Rua da Glória - Foto: André Nery/JC Imagem
Foto: André Nery/JC Imagem
Casa do artista plástico Rinaldo - Foto: André Nery/JC Imagem
Foto: André Nery/JC Imagem
Juniani Marzani, o DJ 440, anima as Terças do Vinil - Foto: André Nery/JC Imagem
Foto: André Nery/JC Imagem
Carol Wanderley e seus bons drinks no Africanas Bar - Foto: André Nery/JC Imagem
Foto: André Nery/JC Imagem
As irmãs Ana Maria (à esquerda) e Ana Paula Melo (vestindo amarelo) reúnem-se todas as terças - Foto: André Nery/JC Imagem
Foto: André Nery/JC Imagem
Terça do Vinil - Foto: André Nery/JC Imagem

O Largo da Santa Cruz e seu entorno foram cenário da fundação do centenário Santa Cruz Futebol Clube, em 1914, e de filmes de realizadores pernambucanos. O curta Texas Hotel (1999), que antecedeu Amarelo manga (2002), ambos de Cláudio Assis, foi gravado por ali, como testemunhou o ator e farmacêutico Arion Santos. O local hoje abriga o espaço cultural Edifício Texas. 

Aos poucos, o Largo da Santa Cruz vai voltando à vida, fervilhando de visitantes e de ofertas tentadoras, seja o comércio informal de capirinhas das Africanas Bar, de Carol Wanderley, ou mesmo a venda da Cerveja Turvalina, de Vitor Maciel e Bia Baggio, produzida ali perto, na Rua da Alegria.

Últimas notícias