BASTIDORES

Ademar Rigueira, o criminalista por dentro da Lava Jato em Pernambuco

No Estado, os principais políticos e empresários enrolados na Lava Jato estão nas mãos do criminalista

Marcela Balbino
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Marcela Balbino
Publicado em 23/04/2017 às 7:15
Foto: Guga Matos/JC Imagem
No Estado, os principais políticos e empresários enrolados na Lava Jato estão nas mãos do criminalista - FOTO: Foto: Guga Matos/JC Imagem
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A Operação Lava Jato e os casos dela derivados varrem o cenário político e empresarial do País há três anos. Pernambuco não passou ao largo e tem vários nomes sob a mira do ministro do STF Edson Fachin ou nas instâncias da Justiça local. Em meio a números superlativos, com milhares de páginas de processos, 300 gigas de vídeos das delações premiadas e 77 delatores só da Odebrecht, um homem sabe os bastidores de grande parte das investigações envolvendo um grupo seleto de empresários e políticos citados em depoimentos. Aos 51 anos, o advogado criminalista Ademar Rigueira Neto assiste a história da Lava Jato no Estado por dentro. Hoje, nomes graúdos enrolados com crimes do “colarinho branco” em Pernambuco e em Estados vizinhos o procuram para a defesa.

Quem o contrata, compra um pacote precioso no mercado jurídico. O diferencial, revela um colega da área, é a boa relação do criminalista com os pares, juízes e desembargadores, além do atendimento exclusivo e o domínio do direito penal econômico, que trata de crimes contra o sistema financeiro, como lavagem de dinheiro e sonegação fiscal. Ele viu neste filão um caminho de sucesso.

Nos quase 30 anos de profissão, o advogado já defendeu uma cartela diferente de clientes: senadores (Humberto Costa e Fernando Bezerra Coelho), deputados, vereadores (Silvio Costa Filho, no caso das notas frias). A capilaridade prossegue na iniciativa privada. O portfólio inclui empreiteiras como Delta, OAS, Odebrecht, Mendes Júnior e Galvão Engenharia, e empresários, como Mário Beltrão, Aldo Guedes e Eduardo Leite. No Estado, o escritório de Rigueira faz a defesa de 90% dos citados na Lava Jato. Quando a Polícia Federal faz nova operação, o criminalista é acionado. Turbulência, Fair Play, Pulso, Politéia, Catilinárias e Vidas Secas foram algumas delas.

Filho de médico, ele é natural do Recife, foi aluno do Colégio São Luís e preserva amigos da época. Com alguns conviveu da escola até a Faculdade de Direito do Recife, onde graduou-se em 1988. A admiração pelo direito penal, lembra, o acompanha desde o início do curso. A vontade de estudar com um dos melhores da área o fez atrasar o semestre para ficar na turma do professor Romualdo Marques. “Ele era referência”, conta.

Ademar deu os primeiros passos no direito criminal quando estagiou no Gabinete da Assessoria Jurídica Organizações Populares (Gajop) e atuou na área de Direitos Humanos. “Meu primeiro contato com os delegados foi de confronto. Tínhamos um trabalho de acompanhamento de pessoas torturadas em delegacia, presas ilegalmente”, diz. A atenção com os clientes ele conta ter herdado da época em que trabalhou no escritório de Lúcio Jatobá.

A opulência do escritório Rigueira, Amorim, Caribé, Caúla & Leitão Advocacia Criminal, num empresarial em Boa Viagem, na Zona Sul do Recife, dá o tom do portfólio. Ocupa duas salas e as paredes estão apinhadas de obras de arte. As 20 serigrafias do valioso álbum “Jazz”, do artista francês Henri Matisse, decoram o ambiente.

Com o aumento dos processos no Distrito Federal, para onde viaja quase toda semana, Ademar sentiu a necessidade de montar uma estrutura em Brasília. Para acompanhar o ritmo, fechou parceria com o escritório do advogado Everardo Gueiros. Há planos de expandir para São Paulo. “Fizemos isso para que quando os nossos processos subissem ao STF ou ao STJ, pudéssemos acompanhar, como fazemos nas instâncias no Estado”.

Em julho do ano passado, na defesa do empresário Apolo Santana, um dos acusados da Operação Turbulência, Rigueira teve o habeas corpus negado pela 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5). Após a decisão, em entrevista, ele afirmou que recorreria ao STJ e não descartava a Suprema Corte. Em setembro, o STF concedeu habeas corpus para os quatro acusados citados.

ESTILO

Apesar do estilo discreto e reservado, Rigueira é um personagem que não passa despercebido. O ar sério e a altura (2,04 metros) intimidam o interlocutor no primeiro contato. Quando era presidente da OAB-PE (2001-2003), ele recorda que uma secretária confidenciou que ele era temido pelos funcionários. “No dia seguinte, parecia ascensorista. Sai dando bom dia para todo mundo, apertando a mão”, brinca. Da época em que era desembargador eleitoral no TRE-PE, entre 2008 e 2012, Ademar guarda na sala a toga, feita sob medida.

A indicação de Ademar para o TRE foi feita pelo ex-governador Eduardo Campos (PSB) e o ex-presidente Lula o nomeou. Na época da morte do socialista, o advogado deu suporte à família. Eles foram contemporâneos no período universitário. O vínculo se estendeu ao longo do tempo e Ademar exercia um misto de advogado e consultor do ex-governador, hoje citado por delatores da Odebrecht.

REFERÊNCIAS E DELAÇÃO

Comparações com outros advogados criminalistas são inevitáveis. Uma delas é com Kakay, um dos mais famosos do Brasil – pelo jeito despojado e por ter defendido presidentes, governadores, ministros e vários figurões da capital federal. Sobre a analogia, Rigueira não se ofende, destaca a competência do colega, mas diz que tem uma postura mais parecida com o sisudo Nabor Bulhões, que advogou para o ex-presidente Fernando Collor no processo do impeachment, para Carlinhos Cachoeira e para Marcelo Odebrecht, preso em Curitiba e nome mais cáustico na “delação do fim do mundo”. 

Assim como Bulhões, que já deu entrevistas afirmando que não era a favor da delação, Rigueira também é reticente com a medida. Para ele, a forma como o processo vem sendo feito fere o princípio da colaboração. “No Brasil, a lei que se criou é muito aberta, não há limites. Hoje a delação está à mercê do que o Ministério Público entende. O processo penal passou a ser instrumento para delação. Para mim, o maior princípio da delação é a espontaneidade. Se você fere o princípio, você macula e vicia”, diz.

“Nas entrevistas do juiz Sérgio Moro você vê que ele adota a política da prisão, delação e condenação. Então a prisão é instrumento para se chegar na delação, mas se isso ocorre, a delação não é espontânea”, critica. O criminalista afirma que nenhum dos seus clientes assinou acordo de colaboração. E os que desejam fazer, ele orienta e encaminha para outro advogado.

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